O roteiro é o mesmo. A educação segue uma engrenagem perpétua em que se estuda para decorar conteúdos que permitirão marcar “X” nos locais corretos da prova que leva para a faculdade que entregará o certificado que suspostamente garantiria uma vida melhor aos 20 e poucos anos. Quando essa trajetória sai do prumo, a situação fica nebulosa e resta se entorpecer de vários modos para seguir a deriva enquanto algumas poucas pessoas nos iates gritam palavras de incentivo: eu consegui, se esforce que você também consegue. Ignorando o fato de que nunca haverá vagas para todos.
Só tem um ponto que é importante lembrar aqui. No geral, quando falamos de crise dos 25 anos partimos de uma visão bem de classe média, com uma família relativamente estruturada, o que permite que o jovem construa essa perspectiva de futuro.
O elemento central aqui é que a crise de um quarto de vida vem do esfarelamento dessa vida idealizada que o jovem construiu. Isso vale tanto para uma classe média alta, com a perspectiva de se manter nesse padrão de vida, quanto para a classe média baixa, que normalmente ambiciona subir a escada social.
O que pouco se fala na maioria dessas matérias é o ponto de vista da grande maioria pobre da sociedade.
No último mês tenho feito um estágio em uma escola pública. Não gosto de tirar conclusões observacionais porque elas tendem sempre a ser por demais limitadas. Mas, o que tenho visto são crianças que provavelmente não terão nem o luxo de viver uma crise existencial. São crianças de famílias desestruturadas, de poucos recursos que, antes mesmo do ensino médio já saem de casa às 6 horas para ir para a escola e voltam às 20h para dormir depois de passarem a tarde trabalhando. Pessoas sem perspectiva social alguma que não conseguem adquirir a menor base acadêmica. Têm dificuldade de compreensão de textos, não são capazes de fazer as multiplicações e divisões mais elementares e não tem a menor chance de formar um raciocínio abstrato.
É uma geração de crianças inteligentes e capazes que permanecerão na ignorância e terão poucas ou nenhuma chance de um emprego melhor.
Particularmente, dessa conversa toda, acho importante dizer que toda essa cultura de desmerecimento do trabalho como algo menor e do empreendedorismo como ápice da cultura capitalista, somado ao consumismo exacerbado e a invenção da necessidade de bens posicionais como medalhas de sucesso ajudam a compor esse cenário temeroso em que vivemos.
Isso faz parte desse caldo cultural que ajuda a sustentar o mito do bilhete premiado que permitiria a ascensão social enquanto a maioria esmagadora da população permanece sem chances de nem mesmo cultivar um sonho para ser destruído pela realidade.