A incercerza: quando acaba a pandemia?
O medo: teremos alguma morte entre estudantes, já que voltarão sem o esquema vacinal completo?
Perdi uma estudante para a meningite alguns anos atrás, outro para uma infecção hospitalar. Nas duas vezes me senti impotente, inútil e questionei o sentido de ser professor quando as crianças não tem nem o direito à vida garantido. Nas duas vezes demorei para me recompor. Agora, depois de tanto tempo em salas de aula “híbridas”, possibilidades restritas, a prática docente atravessada pelas preocupações sanitáriais e os tais protocolos, sinto que o movimento de me refazer é justamente o grande desafio para 2022. Meu, dos colegas, da escola, de quem trabalha, pensa e luta a educação de uma forma geral.
Ser professor importa, sim. A educação importa, sim. É preciso falar sobre imigração, racismo, sexismo, violência de gênero e desigualdade na sala de aula, sim. Mas pra tudo isso ter sentido, é preciso fazer com que a escola tenha sentido — começando por tornar inaceitável, principalmente por parte de educadores, qualquer comentário como os que abrem este texto.
Uma das últimas falas da reunião foi de uma professora que ajudou a organizar o grupo de WhatsApp e a busca ativa por estudantes que sumiram na pandemia. Sua voz embargou ao falar das situações enfrentadas ao bater de porta em porta, e eu me lembrei da minha mãe, assistente social a vida toda.
Trabalhar em territórios vulneráveis, onde as condições para uma vida digna estão sempre estraçalhadas, quando estão, é compreender pouco a pouco que você nunca terá apenas as atribuições que sua categoria profissional pressupõe. Será preciso redobrar a escuta, aumentar a sensibilidade, reforçar a mente, ampliar a solidariedade, recuperar o sentido da palavra “humano”. Será preciso lutar, em coletivo, pela sobrevivência e resistência, sua e da comunidade. Reconhecer as diferenças, os privilégios, e construir sobre os abimos pontes,
da borda para o centro, de baixo para cima. Ainda mais em um país que destrói tudo isso em uma velocidade impressionante.
Mãe, obrigado por emprestar sua força, ainda que eu nunca vá conseguir alcançar nem metade dela. Você sempre será minha heroína.
E que o ano letivo que começou hoje possa terminar com notícias — e conversas na sala dos professores — outras.